Descrição
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Numa época em que os jornais funcionavam como uma espécie de tribuna de opinião, e suas colunas eram divididas entre diatribes de caráter político e textos rebuscados nascidos da pena de literatos, surgiu a figura de João do Rio. O autor, homenageado na Festa Literária de Paraty (Flip) em 2024, usou as páginas dos diários como terreno de experimentação. Misturou apuração jornalística com estilo literário e ajudou a formatar um dos gêneros mais apreciados pelo leitor brasileiro: a crônica.
Gente às janelas reúne um panorama variado dessa produção do autor. A seleção dos textos, formada por material raro, coletado de arquivos e bibliotecas nacionais e estrangeiras, é fruto de quase uma década de pesquisa.
Aquele que se tornaria um dos nomes mais importantes da crônica brasileira assumiu a cidade como pseudônimo e, como um João qualquer, saiu à rua. Flanou sem rumo, falou com toda a gente, ouviu histórias, reparou detalhes, frequentou tanto os ambientes chiques como os lúgubres, percorreu vielas e becos onde o jornalismo não punha o pé. E transformou essa alma encantadora das ruas em material para os seus textos.
Adotou técnicas que eram novidade para o jornalismo praticado até então – como a reportagem e a entrevista – e apresentou tudo isso com um talento herdado de muita leitura, consumidor ávido que era de tudo o que se produzia em literatura fora do Brasil. Numa Rio de Janeiro ainda muito pouco alfabetizada, João do Rio conquistou um leitorado enorme, e tornou-se uma das figuras mais conhecidas – e também controversas – dos primeiros anos da República.
“Se a minha ação no jornalismo brasileiro pode ser notada é apenas porque desde o meu primeiro artigo assinado João do Rio eu nunca separei jornalismo de literatura, e procurei sempre fazer do jornalismo grande arte”, escreveu ele certa vez à sua mãe, Florência. Isso explica, na opinião da editora Graziella Beting, organizadora do volume e pesquisadora da obra de João do Rio, por que, depois de mais de 100 anos, ainda há interesse em sua leitura.
Gente às janelas, organizado em blocos temáticos, acompanha a trajetória do escritor, abordando os diferentes aspectos de sua obra por meio de 33 textos. Apresenta alguns de seus primeiros e pouco conhecidos contos, como “Impotência”, sua estreia na ficção, ou “Ódio (Páginas de um diário)”, em que aborda a homossexualidade – tema pelo qual sofreu ataques e preconceito a vida toda. Outros textos revelam como o autor foi introduzindo aos poucos nas colunas de jornal as interviews ou inquéritos – enquanto o jornalismo não se definia pela adoção do termo “entrevista” –, e como usou o recurso muitas vezes para inserir personagens ficcionais ao que relatava.
Em crônicas como “Gente às janelas”, “Tabuletas”, ou “As mariposas do luxo”, vê-se o cronista observador das curiosidades e desigualdades da sociedade carioca da época. Tido como primeiro repórter brasileiro, João do Rio também foi pioneiro em cobrir, diretamente do campo, uma partida do iniciante foot-ball – esporte, aliás, que ele julgou sem futuro no país.
Outra raridade presente na coletânea é “Na favela – trecho inédito do Rio”, o primeiro registro da visita de um jornalista ao Morro da Providência para descrever o que era e como viviam as pessoas no local conhecido como Favela, onde migrantes do arraial de Canudos haviam se instalado depois da guerra. O cronista denunciava as más condições desses acampamentos miseráveis, e cobrava providências do governo antes que esse tipo de moradia precária se espalhasse pela cidade.
O resultado das incursões a locais pouco frequentados por jornalistas, ou dos quais mal se falava na imprensa rendeu outros textos, como “O barracão das rinhas”, “Visões d’ópio”, “No mundo dos feitiços”. Tal um etnógrafo, ele visita e relata o que viu, muitas vezes de forma romanceada, numa rinha de briga de galo no subúrbio, nas fumeries de ópio dos imigrantes chineses ou nas casas de candomblé.
Se João do Rio conquistou muitos fãs – como atestam as impressionantes fotos de seu cortejo fúnebre, que parou a capital –, também colecionou uma série de desafetos. Não à toa: sua pena serviu tanto para tentar ajudar denunciar a gente miserável como para provocar e atacar. Foi preconceituoso e sofreu preconceito, foi racista e sofreu racismo, nunca se sentiu totalmente aceito no círculo intelectual ou político da época.
“Um caso comum” ou “Ser snob” são exemplos de crônicas presentes no livro nas quais o autor destila toda a sua ironia e acidez à alta-roda carioca, que vivia a fantasia de viver na Europa. Sonho do qual ele, aliás, de certa forma compartilhava. Vestia-se como um dândi, de cartola e fraque, e desfilava, com jornais estrangeiros debaixo do braço, pelos cafés e endereços chiques da capital carioca – que, como dizia, vivia um “esforço despedaçante de ser Paris”.
SOBRE A EDIÇÃO
João do Rio foi o primeiro autor brasileiro publicado pela CARAMBAIA. A reedição de sua obra, em volume encadernado em capa dura, com acabamento em baixo relevo e pintura metalizada, celebra os 10 anos da editora e a justa homenagem ao escritor em Paraty, em outubro de 2024.
O conteúdo de Gente às janelas é o da primeira parte do volume Crônica, Folhetim, Teatro, da Coleção Acervo da CARAMBAIA, que é a edição mais completa da obra de João do Rio já publicada no Brasil. O livro tem projeto gráfico dos arquitetos Cristiane Muniz e Fernando Viégas e dos designers da Casa 36.
A organização e o texto introdutório são de Graziella Beting, diretora editorial da CARAMBAIA, que estudou a vida e a obra de João do Rio para sua pesquisa de mestrado e doutorado (Universidade Paris II), entre 2007 e 2014.
Autor(a)
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Celebridade em sua época, João do Rio é o pseudônimo mais conhecido de Paulo Barreto (1881-1921), ao lado de outros, como João Antônio José, ou Joe. Aquele que se tornaria um dos autores mais famosos e controversos do Brasil em sua época, começou a carreira aos 19 anos, no jornal de José do Patrocínio. Jovem com grandes aspirações, antes de chegar ao jornalismo havia tentado a carreira diplomática – e teria sido desencorajado a dar continuidade à sua candidatura. Motivo: sua aparência – o que, subentendia-se, era uma referência ao tom de sua pele e à sua suposta homossexualidade.
Trabalhou a vida toda em jornais e revistas e, aos 29 anos, em sua terceira tentativa, conquistou uma vaga na Academia Brasileira de Letras, sendo o mais jovem autor a assumir uma cadeira. Foi o primeiro a vestir o fardão dourado, em uso até hoje. Ao longo de sua carreira, publicou mais de 2.500 textos – entre contos, crônicas, críticas, peças, folhetins – e 25 livros. Usou a sua pena para denunciar a miséria do povo humilde, mas foi também, ao mesmo tempo, o colunista social frequentador dos salões da alta roda, acompanhando de vários ângulos as transformações da capital naqueles primeiros anos de República. Faleceu de ataque cardíaco fulminante pouco antes de completar 40 anos.
Ficha Técnica
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Informação Adicional
PDF primeiras páginas Clique aqui para visualizar Dimensão (cm) 13,6 x 18,6 x 2,1 Peso (g) 290 Ano de Publicação 2024 Número de Páginas 272 Encadernação e Acabamento Capa dura com pintura metalizada e acabamento em baixo relevo ISBN 978-65-5461-074-2 Escritor(a) João do Rio Tradutor(a) Ensaísta(s) Designer Casa 36, Cristiane Muniz, Fernando Viégas Ilustrador(a) Idioma Original Português tradutor ensaio
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